Recentemente fui convidado mais uma vez pela linda e grande desenhista Carolina Mancini (clica no nome que irá diretamente a fanpage dela) para fazer um novo conto e tê-lo publicado no site Quotidianos por conta do GRANDE SUCESSO que obteve no site (este conto que vos apresento aqui em meu blog).
O Quotidianos tem diariamente textos de conteúdo Fantástico feitos por grandes escritores. E juntamente a arte de outros grandes desenhistas que trabalham em cima do texto a ser publicado/divulgado transformam o site num sucesso de público e da alta Literatura contemporânea. Deixo abaixo o meu 1º texto que rolou no Quotidianos e o link dele caso queiram conferir diretamente( http://quotidianos.com.br/2014/08/09/sonata-dissonante/ ).
Arte por Carolina Mancini |
O sol nas pontas dos pés ardia sob aquela pele negra de cabelo
desgrenhado com seu corpo grande e gorduroso que chorava litros de
lúcidas lágrimas. Seu vestido amarelo desbotado, cheio de flores azuis
sujas pelo barro da antiga manhã torrencial, não abalavam todo aquele
suspiro de vida. Com um pedaço de pau embaixo das axilas ela exasperava
toda energia aos movimentos das mãos e braços no ar. Balbuciando
palavras indecifráveis à plateia que não quisera ouvir. E apenas olhavam
espantadas com aquele redemoinho negro a se formar no céu. Uma
temporada se anunciava sem fim. Do canto dali, próximo ao semáforo, a um
passo das faixas de proteção contra veículos angustiados e sedentos que
vibravam pela verde paixão, ela não saía do lugar.
Ao seu lado um fiel caramelo a vigiava, e corria atrás daquelas
bestas barulhentas sem patas que se aproximavam dela exalando uma cinza
fumaça, ele rosnava e grunhia atenção para a sinfonia da sua amada. Já
ela teimava em abdicar de seu tempo a demonstrar o esboço da sonata
inacabada. Sussurrando notas e contratempos sob a lembrança riscada na
calçada a carvão de um churrasco que ocorrera no quintal de uma casa
abandonada.
A transitividade emperrava o tempo. Uns indo, outros vindo e suas
angústias continuavam resfriadas assoando os narizes resmungões pela
cidade desbotada. A sinfonia começara sutil. Os pássaros pararam sob o
fio elétrico. Um três sete e dez. Em cada nota um sibilar anil. As
árvores com seus majestosos galhos entrelaçavam tronos que tremiam ao
escutar o vento dizer: ‘Mil rosas marcharam à terra intocada…’.
Os braços de Janara continuaram a desenhar no ar, como um pincel de um
aprendiz sem espátula, e a sinfonia seguia aumentando seu ritmo enquanto
o vento farfalhava veloz a cabeleira da selva de pedras que restava.
Janara tinha só sete anos quando escutou pela primeira vez seu pai cantar, ‘Longe do céu bem alto ao mar, um barco navega na espera que o vento lhe traga asas para pousar.’ Desde então, compõe rapsódias renegadas e abafadas entre véus negros de fumaça sem ar.
Num brado haviam partido e uma nuvem amarga desvanecera o brilho que
entoava ao lado da estrada. Janara cuspia a sonata com toda força que
lhe restava. O pulmão se enchera de lágrima, mas ela não se resignara a
tocar até a última nota daquele rabisco desmesurado. Num átimo
dissonante caramelo fora amassado por completo pelo monstro sem patas,
que sempre levara homens e crianças a algum lugar daquela terra
intocada.
Texto: Wagner Bezerra
Arte: Carolina Mancini
2 comentários:
Bom dia Wagner!
Meu nome é Maurílio, sou filósofo e sociólogo e, corro o risco escrevendo crônicas e contos também. Visitando outros blogs no google, encontrei o seu.Seu estilo de escrever é surpreendente, muito bom mesmo. Também gosto de escrever alternando relevos de palavras, criando movimentos suaves ou intensos em meio às frases. Pelo menos essa foi a minha percepção desse texto que li.Valeu!
Maurílio Ribeiro da Silva
Olá Maurílio, é um enorme prazer saber que você gostou do meu conto e é exatamente isso que disseste sobre ele, estou tentando mudar esse estilo pra não cansar muito os leitores mas escrever mais simples é muito mais difícil do que eu imaginava...rsrs :)
Visitarei teu blog! Um grande abraço! :D
Postar um comentário