segunda-feira, setembro 24, 2007

Poesia do tempo

O equívoco entre poesia e povo já é demasiadamente sabido para que valha a pena assistir nele. Denunciemos antes o equívoco entre poesia e poetas. A poesia não se 'dá', é hermética ou inumana, queixam-se por aí. Ora, eu creio que os poetas poderiam demonstrar o contrário ao público. De que maneira? Abandonando a idéia de que poesia é evasão. Não basta dizer que já não há torres de marfim; a torre desmoronou-se pelo ridículo, porém mitos poetas continuam vendo na poesia um instrumento de fuga da realidade ou de correção do que essa realidade ofereça de monstruoso e de errado. Desenvolveu-se então entre eles a linguagem cifrada, que nenhum leigo entende, e que suscita o equívoco já entre poesia e povo.
Participação na vida, identificação com os ideais do tempo(e esses ideais existem sempre, mesmo sob as mais sórdicas aparências de composição), curiosidade e interesse pelos outros homens, apetite sempre renovado em face das coisas, desconfiança da própria e excessiva riqueza interior, eis aí algumas indicações que permitirão talvez ao poeta deixar de ser um bicho esquisito para voltara a ser, simplesmente, um homem".
By:Carlos Drummond de Andrade

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